sexta-feira, julho 10, 2009
O Socorro
Millôr Fernandes (Pif-Paf)
Ele foi cavando, foi cavando,
cavando, pois sua profissão
- coveiro - era cavar.
Mas, de repente, na distração do ofício
que amava, percebeu que cavara de mais.
Tentou sair da cova e não conseguiu.
Levantou o olhar para cima e viu que,
sozinho, não conseguiria sair. Gritou.
Ninguém atendeu.
Gritou mais forte. Ninguém veio.
Enlouqueceu de gritar, cansou de esbravejar,
desistiu com a noite.
Sentou-se no fundo da cova, desesperado.
A noite chegou, subiu,
fez-se o silêncio das horas tardas.
Bateu o frio da madrugada e, na noite escura,
não se ouvia mais um som humano,
embora o cemitério estivesse cheio dos pipilos
e coaxares naturais dos matos.
Só pouco depois da meia-noite
é que lá vieram uns passos.
Deitado no fundo da cova o coveiro gritou.
Os passos se aproximaram.
Uma cabeça ébria apareceu lá em cima,
perguntou o que havia: "O que é que há?"
O coveiro então gritou, desesperado:
"Tire-me daqui, por favor.
Estou com um frio terrível!".
!Mas coitado!! - condoeu-se o bêbado.
- "Tem toda razão de estar com frio".
Alguém tirou a terra toda
de cima de você, meu pobre mortinho!".
E, pegando na pá, encheu-a de terra
e pôs-se a cobri-lo cuidadosamente.
Moral: Nos momentos graves é preciso
verificar muito bem para quem se apela
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