quinta-feira, outubro 08, 2009

Um conto de fadas



Maria Emilia Voss, uma peregrina de Santiago,
conta a seguinte história:

Por volta do ano 250 a.C., na China antiga,
um certo príncipe da região de Thing-Zda
estava às vésperas de ser coroado imperador;
antes, porém, de acordo com a lei,
ele deveria se casar.

Como se tratava de escolher a futura imperatriz,
o príncipe precisava encontrar uma moça
em quem pudesse confiar cegamente.

Aconselhado por um sábio, ele resolveu convocar
todas as jovens da região, para encontrar
aquela que fosse a mais digna.

Uma velha senhora, serva do palácio
há muitos anos, ouvindo os comentários
sobre os preparativos para a audiência,
sentiu uma grande tristeza
- pois sua filha alimentava
um amor secreto pelo príncipe.

Ao chegar em casa e relatar o fato à jovem,
espantou-se ao ouvir que ela também
prtendia comparecer
A senhora ficou desesperada:

- Minha filha, o que você fará lá?
Estarão presentes apenas as mais belas
e ricas moças da corte.
Tire esta idéia insensata da cabeça!
Eu sei que você deve estar sofrendo,
mas não transforme o sofrimento em uma loucura!

E a filha respondeu:

- Querida mãe, não estou sofrendo
e muito menos fiquei louca;
sei que jamais poderei ser a escolhida,
mas é minha oportunidade de ficar pelo menos
alguns momentos perto do príncipe,
isto já me torna feliz - mesmo sabendo
que meu destino é outro.

À noite, quando a jovem chegou ao palácio,
lá estavam efetivamente todas as mais belas moças,
com as mais belas roupas, as mais belas jóias,
e dispostas a lutar de qualquer jeito
pela oportunidade que lhes era oferecida.

Cercado de sua corte, o príncipe anunciou
o desafio:
- Darei para cada uma de vocês uma semente.
Aquela que, dentro de seis meses,
me trouxer a flor mais linda,
será a futura imperatriz da China.

A moça pegou a sua semente, plantou-a num vaso,
e como não tinha muita habilidade nas artes
da jardinagem, cuidava terra com muita paciência
e ternura - pois pensava que, se a beleza das flores
surgisse na mesma extensão de seu amor,
ela não precisava se preocupar com o resultado.

Passaram-se três meses e nada brotou.
A jovem tentou um pouco de tudo,
falou com lavradores e camponeses -
que ensinaram os mais variados métodos de cultivo
- mas não conseguiu nenhum deu resultado.
A cada dia sentia-se mais longe o seu sonho,
embora o seu amor continuasse tão vivo como antes.

Por fim, os seis meses se esgotaram,
e nada nasceu em seu vaso.
Mesmo sabendo que nada tinha para mostrar,
estava consciente de seu esforço
e dedicação durante todo aquele tempo,
de modo que comunicou a sua mãe que retornaria
ao palácio, na data e hora combinadas.

Secretamente, sabia que este seria seu último
encontro com o bem-amado, e não pretendia perde-lo
por nada neste mundo.

Chegou o dia da nova audiência.
A moça apareceu com seu vaso sem planta,
e viu que todas as outras pretendentes
tinham conseguido bons resultados:
cada uma tinha uma flor mais bela do que a outra,
das mais variadas formas e cores.

Finalmente vem o momento esperado:
o príncipe entra e observa cada uma das pretendentes
com muito cuidado e atenção.
Após passar por todas, ele anuncia o resultado
- e indica a filha de sua serva como sua nova esposa.

Todos os presentes começam a reclamar,
dizendo que ele escolheu justamente aquela
que não tinha conseguido cultivar nenhuma planta.

Foi então que, calmamente, o príncipe
esclareceu a razão do seu desafio:

- Esta foi a única que cultivou a flor
que a tornou digna de se tornar uma imperatriz:
a flor da honestidade.
Todas as sementes que entreguei
eram estéreis, e não podiam nascer de jeito nenhum.


Paulo Coelho
em o Globo 127

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