segunda-feira, julho 27, 2009
Não Pode Existir Amor .....
Não Pode Existir Amor Sem Verdadeira Troca
-Antoine de Saint-Exupéry-
Não te lembras de ter encontrado na vida
aquela que se considera um ídolo?
Que havia ela de receber do amor?
Tudo, até a tua alegria de a encontrares,
se torna homenagem para ela.
Mas, quanto mais a homenagem custa, mais vale:
ela saborearia melhor o teu desespero.
Ela devora sem se alimentar.
Ela apodera-se de ti para te queimar à sua honra.
Ela é semelhante a um forno crematório.
Ela, na sua avareza, enriquece-se de várias capturas,
julgando encontrar a alegria nessa acumulação.
E não acumula mais do que cinzas.
Porque o verdadeiro uso dos teus dons
era caminho de um para o outro, e não captura.
Ela verá penhores nos teus dons
e abster-se-á de tos conceder em paga.
Na falta de arrebatamentos que te satisfariam,
a falsa reserva dela far-te-á ver que
a comunhão dispensa sinais.
É marca da impotência para amar,
não elevação do amor.
Se o escultor despreza a argila,
terá de modelar o vento.
Se o teu amor despreza os sinais do amor
a pretexto de atingir a essência,
o teu amor não passa de um palavreado.
Não descuides as felicitações,
nem os presentes, nem os testemunhos.
Serias capaz de amar a propriedade,
se fosses excluindo dela, um por um,
como supérfluos, porque particulares demais,
o moinho, o rebanho, a casa?
Como construir o amor, que é rosto lido
através da urdidura, se não há urdidura
sobre a qual escrever?
Sem cerimonial de pedras, não haveria catedral.
Nem haverá amor sem cerimonial em vistas do amor.
Eu só atinjo a essência da árvore se ela modelou
lentamente a terra segundo o ceriomonial das raízes,
do tronco e dos ramos.
Nessa altura, ela é una.
Tal árvore e não uma outra.
Mas aquela acolá desdenha as trocas,
que a haviam de fazer nascer.
Ela procura no amor um objecto capturável.
E esse amor não tem significado algum.
Ela julga que o amor é presente que ela pode fechar nela.
Se tu a amas, é porque ela te conquistou.
Ela fecha-te nela, convencida de enriquecer.
Ora o amor não e tesouro a conquistar,
mas obrigação de parte a parte, fruto
de um cerimonial aceite,
rosto dos caminhos da troca.
Jamais essa mulher nascerá.
Só de uma rede de laços se pode nascer.
Ela continuará a ser semente abortada,
poder por empregar, alma e coração secos.
Ela há-de envelhecer funebremente, entregue
à vaidade das suas capturas.
Tu não podes atribuir nada a ti próprio.
Não és cofre nenhum. És o nó da diversidade.
O templo, também é sentido das pedras.
Antoine de Saint-Exupéry, in 'Cidadela'
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